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9 de fev. de 2016

O Zé

Eu nunca fui realmente bom em alguma coisa.
Nunca fui destaque, estrela, muito menos popular. 
Nunca ganhei uma rifa, uma linha que fosse de um bingo qualquer. 
Eu nunca tive créditos pelo que desenvolvi.
Também nunca liguei muito para o que os outros pensam sobre mim, apesar de saber do que falam e como me julgam. 
Até algum tempo atrás eu não me arrependia de nada que fiz justamente por pensar minuciosamente em cada detalhe. Eu era o tipo do diretor chato, o narrador da própria história. Escrevia linha por linha, achando que podia mudar tudo o que soava distorcido ou fora do tempo. 
Aos olhos parecia certo, confortável. 
Mas em algum momento da história as coisas foram se perdendo. Ou melhor, eu e as coisas além das pessoas. 
Eu vi pessoas virando as costas, vi tantas outras fazendo as malas e mudando-se para o lado oposto sem ao menos ter a chance de dizer 'adeus' ou um tempo para pedir perdão. 
Eu distribui mágoas e criei um monstro chamado solidão. Ou melhor, eu me tornei um monstro criado por ela: Um líder dos corações partidos. 

É como virar um copo vazio à espera de que este tenha algum outro gosto. Esperando por uma mísera gota que não aquelas que caem dos olhos. 
Eu me tornei um palhaço que além dos anos perdeu também o riso, e a alegria que as cores davam à vida. Um espetáculo sem artista, sem plateia. Sem início, meio ou palmas anunciando o fim. 
Eu me tornei um corpo vago, 
apoiado na vontade de me tornar o melhor no que faço. Em busca de uma chance para tentar ser melhor do que fui. Em busca de algo do qual eu possa me orgulhar que não os chutes na trave em pênaltis mal batidos; Os tropeços em cada culpa arremessada à pessoas inocentes ou os pisões em falso nos erros que me levaram cada vez mais longe de quem eu gostava e queria estar próximo. 

Eu sou aquele que dos montes tornou-se um só. 
Uma estrada esburacada por sonhos e oportunidades jogadas fora. Um livro qualquer, sem capa, em branco, escrito por algum Zé.

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